Qual banda em sua consciência, nos dias de hoje, gravaria um álbum duplo em menos de um ano do lançamento de sua obra mais importante? Entretando, em 1968, sairia “The Beatles”, aquele disco cuja a capa toda branca ficaria lembrada para todo e sempre como “White Album”. Gravado meses depois do seminal “Sgt. Peppers” e dos compactos duplos da trilha do filme Magical Mistery Tour, os Beatles estavam desgastados pessoalmente, mas não na inspiraçao. Muitos críticos e fãs dizem ser este o melhor trabalho que o quarteto gravou. Nele se encontra de tudo: brincadeiras com os críticos que encontravam “mensagens subliminares” nas letras das músicas do grupo, blues, vaudeville, country rock, pré-heavy metal, música experimental, ataques pessoais, brigas, amor, ódio, solidão, porcos…
Durante a gravação vários desentendimentos fizeram com que a banda quase acabasse (Ringo chegou a deixar a banda, voltando semanas depois). Muitas faixas não contam com a colaboração dos quatro e sabe-se que a pressa em terminá-lo gerou esta áurea que até Jonh Lennon falou: “este disco é um disco de Jonh Lennon com uma banda, Paul com uma banda e George com uma banda… não é um disco dos Beatles…”. Comentários polêmicos de Jonh a parte, “White Album” é sim uma obra prima.
O álbum abre com “Back in the URRS”, um rock básico e direto, meio que uma mensagem para aqueles que acusaram os Beatles de não saberem mais tocar rock and roll, por conta das experimentações dos 3 discos anteriores. Na música, Paul comanda a bateria assim como na proxima “Dear Prudence”, uma balada belíssima que Lennon compôs para Prudence, irmã de Mia Farrow que estava passando por diversos problemas de ordem psicológica nos meses que a banda estava na Índia fazendo meditaçao trancedental com o Marrarishi Yogi. Abro parênteses para a linha de baixo que Paul compôs para esta faixa e sua performance como baterista. “Glass Onion” foi uma brincadeira de Jonh, fazendo uma letra para gozar com os críticos que ficavam buscando mensagens em suas letras. É nela que ele diz que o “Walrus Is Paul”.
“Ob-la-di Ob-la-da” é a proxima, um pop reggae muito legal. Quem se ligou no Anthology ouviu que a primeira versão dela era bem diferente. Reza a lenda que no dia de sua gravaçao, Jonh chegou atrasado, correu para o piano e pedindo desculpas, começou a tocá-la de maneira mais rápida do que nos ensaios anteriores. Paul gostou muito e ela ficou como conhecemos. “Wild Honey Pie” é uma pequena peça de menos de um minuto, servindo de abertura para “The Continuing Story Of Bungalow Bill”, música de Jonh que traz como participação especial a voz infantil e extremamente aguda de Yoko Ono em uma frase.
Se George Harrison só tinha direito de gravar uma música de cada lado de um álbum, então no “White Album”, que é duplo, ele entrou com quatro faixas. Se você levar em conta que o disco inteiro tem 30 faixas, você pode ter a noção de que como Jonh e Paul, minimizavam a criatividade do guitarrista como compositor. Mas George, que também era tão bom quanto seus companheiros, trouxe Eric Clapton para participar daquela que muitos consideram a melhor música do disco. “While My Guitar Gently Weeps” fala, digo, chora em nossos ouvidos. Linda melodia e linda letra que se completam com um solo de Clapton que já entrara na história da música. “Happiness Is A Warm Gun”, música hipnotizante onde pode-se destacar o andamento da bateria de Ringo Starr e os backings vocals de Paul e George simulando o som de uma arma disparando (bang-bang).
O lado B do bolachão começa com “Martha My Dear”, canção que Paul compôs, segundo alguns, para sua cadela. Seu trabalho no piano e os metais tocados por músicos de estúdio são os destaques. “I’m So Tired” de John é bem arrastada onde ele diz que não conseguiu pregar os olhos à noite e no fim brada que quer um pouco de paz de espirito. “Piggies” de Harrison, foi composta na Índia. Esta faixa era uma das favoritas do maníaco serial-killer Charles Manson, que achava que a letra, assim como “Helter Skelter”, eram mensagens de uma suposta rebelião contra negros e “seres inferiores” onde o próprio Manson seria o lider. Ele chegava a assassinar pessoas e escrevia com sangue a palavra “Piggies”.
“Rocky Racoon” é uma deliciosa canção que lembra os saloons do velho oeste americano. George Martin toca o piano solo. “Don’t Pass Me By” é a primeira composição solo de Ringo Starr e também lembra músicas de country e western. Ótimo refrão.
Segundo alguns, Lennon teria ficado muito chateado por nao ter sido chamado por Paul para ajuda-lo em “Why Don’t We Do It In The Road”. Na verdade, Paul tocou todos os instrumentos e cantou muito nesta faixa e defendeu-se dizendo que Jonh estaria em outro estúdio colaborando com uma faixa de George. “I Will” é uma baladinha acústica muito bonita. O primeiro disco encerra-se com a tocante balada voz e violao que Jonh compos para sua mae, Julia. Simples, linda e emotiva. É assim que o primeiro disco encerra-se.
O segundo disco do “White Album” abre com o clássico “Birthday”, uma das últimas músicas que John Lennon e Paul McCartney colaboraram juntos para composição. “Yer Blues” vem logo em seguida e, como o nome mesmo induz, se trata de um blues rock com uma levada um tanto psicodélica. Esta foi a única música dos Beatles que John cantou ao vivo no Festival de Toronto em 1969. A terceira faixa é “Mother Nature’s Song”, gravafa somente por Paul. Paul declarou que compôs “Mother Nature’s Son” lembrando-se de seus tempos de infância, quando ficava encantado ao passear com sua turma de classe pelos campos ingleses ouvindo o professor discorrer sobre as espécies de pássaros.
“Everybody’s Got Something To Hide Except Me And My Monkey”, mais uma com pitadas de psicodelismo, é a quarta faixa, com o excelente vocal de John Lennon. “Sexy Sadie”, que fala sobre a desilusão de John pelo fato do guru Maharishi ter tentado seduzir Mia Farrow, é talvez um dos pontos mais fortes desta segunda parte do álbum branco. Balada sarcástica, bem ao gosto de John Lennon.
“Helter Skelter”, clássico absoluto não só dos Beatles como também do rock n’ roll, foi resultado de uma tentativa de Paul gravar a música mais barulhenta que ele pudesse fazer depois de saber que o grupo The Who havia feito algo semelhante em “I Can See For Miles”. Existe uma versão de 27 minutos que não entrou no álbum e continua inédita até hoje. Vários grupos regravaram esta faixa, entre eles, U2 e Mötley Crüe!
“Long, Long, Long”, balada relaxante, vem logo em seguida, a primeira das duas faixas compostas por George Harrison nesta segunda parte do álbum. “Revolution 1” é praticamente uma versão acústica da música “Revolution” que apareceu no compacto junto com “Hey Jude”. A nona faixa, “Honey Pie”, é nada mais nada menos que uma música western com clima psicodélico, que dificilmente você vai escutar algo parecido em outro lugar.
Em seguida mais uma composição de Harrison, a excelente “Savoy Truffle”, com destaque para o órgão e guitarra fuzz muito bem encaixadas. Ela foi inspirada em uma caixa de bombons, especialmente para seu amigo Eric Clapton, doido por doces. Quando você pensa que já escutou muitas músicas boas num disco apenas, chega “Cry Baby Cry”, mostrando que criatividade e inspiração não faltava à banda naquela época. John baseou-se em histórias que ouvia quando era criança para compor.
“Revolution 9”, uma das maiores provas da presença de Yoko Ono no álbum, se trata de verdadeira colagem de sons que posteriormente se tornaria o estilo dos três primeiros álbuns experimentais de John e Yoko. Paul foi o único beatle a não participar das gravações. Para finalizar o disco, enfim, “Good Night”, escrita por John para seu filho, Julian. Foi cantada por Ringo acompanhado em estúdio por uma orquestra.
Agradecimento especial: Ricardo Diamante
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